DEPOIMENTO DE UM PAI

Onde terei errado na minha função de pai!!!
Pois a menina de 15 anos, que carreguei no colo
e que admirei através do vidro da maternidade
na noite de julho em que a lâmpada cor-de-rosa
se acendeu, recusa com um sorriso provocador qualquer
coisa que lembre a festa de aniversário, e apenas
me deposita um beijo na minha testa, como se esse
gesto bastasse para ela provar que acaba de
completar 15 anos.

Não sei onde foi buscar esse despojamento e essa
diferença pela vaidade frágil que dura o tempo
do spray no ar. Chego a me atemorizar. Penso que,
por desleixo ou falta de prática, falhei em
algum ponto; e criei a filha de um operário, de
um ferroviário, de um lutador de boxe que perdeu
por pontos, de um balconista, de um lanterninha
de cinema, ou, para pensar o pior; criei a filha
de um mero cronista da cidade.

Que Deus me perdoe se falhei. E que Deus me
abençoe se minha filha de 15 anos pensa
exatamente como deve pensar uma garota de 15 anos,
sem os cacoetes e sem os falsetes que nós,
os adultos, gostamos de emprestar a essa idade
própria das decisões pessoais, quando se
aprende a usar o dom, hoje raro e falsificado,
chamado: a liberdade de ser.

"UM PAI"